Um conjunto de palavras
que ecoou de diferente forma nos ouvidos de todos os seus primeiros ouvintes.
Soldados romanos treinados e habituados a execuções com recurso à crucificação
estreavam-se como tema de oração por parte do executado. Líderes religiosos
hebreus, imaculados aos seus próprios olhos, habituados a ver os outros como
carentes de perdão, eram agora alvo de intercessão por parte do impuro
“maldito” pendurado no madeiro. A multidão que implorou pela libertação de um
culpado em detrimento da crucificação de um inocente, numa coisa concordaria
com os soldados, os líderes religiosos, assim como muitos que presentemente
leem os Evangelhos: orações intercessoras por perdão precisava o “Rei dos judeus”
crucificado.
Jesus, em vez de pedir
por si, intercedia por todos aqueles que física, psicológica, emocional e
espiritualmente de forma efetiva O maltratavam. O facto de Jesus fazer este
pedido ao Pai, mesmo quando nenhum dos contemplados na Sua oração tinha pedido
perdão, é um amplificador da grandeza majestática da oração proferida pelo
Cristo.
O contraste connosco é
gritante. Pedir perdão por quem nos magoou de forma profunda, e grandes
cicatrizes nos ofereceu, não é propriamente o pão que em cada dia nos tem
alimentado. Infelizmente, os ódios e ressentimentos são alimentados durante
demasiado tempo, e eleitos como alimentação gourmet por muitos cristãos que,
nesta matéria, não estão a seguir as pisadas de Cristo, e, como resultado, têm
usufruído dos sintomas típicos da retenção do perdão.
Um cristão fica sem
espaço para ódio e ressentimento, na direta proporção em que dá lugar a que
Cristo viva em si e por si: “já não sou eu quem vive, mas Cristo vive em mim.”
(Gálatas 2.19,20 ARA). Assim como o Mestre ensinou, não é lógico, nem tão pouco
normal, que eu, a quem muito, imenso por Ele me foi perdoado, esteja ainda,
neste tempo, a reter perdão, em relação a todos aqueles que, em comparação com
o que a Cristo fiz, me fizeram tão pouco ou quase nada (Mateus 18.23-35). Até
porque, seja o que for que te tenham, ou me tenham feito a mim, a maior ofensa
não é contra mim, contra ti, ou contra qualquer outro ser humano, mas é sempre
contra o Senhor (Salmo 51.4 ARA).
“Aquela pessoa não
merece ser perdoada” é uma das razões recorrentemente invocada como
pseudo-atenuante para a não prática do perdão. Neste e noutros assuntos, à
vista de cada um sobressai o comportamento do próximo, mas o comportamento
impróprio do próprio é relegado para segundo, ou ainda mais distante plano.
Habitualmente temos dois pesos e duas medidas: avaliamos os outros com
exigência micrométrica e a nós mesmos com um laxismo quilométrico. O Senhor,
perfeitamente justo, perdoou-me em Cristo Jesus sem que eu o mereça. Quem sou
eu para dizer que o outro não merece? À luz da oração que nos foi ensinada,
como é que eu posso ser perdoado se não perdoar o outro (Mateus 6.14-15 ARA)?
Pedro Girão