sábado, 30 de junho de 2018

Jesus ao Centro - Eduardo Melo

À minha volta

Olhando superficialmente à volta parece vivermos num mundo religioso que se apresenta com belos templos, alguns enormes monumentos tidos e classificados como património mundial. São verdadeiras obras de arte, sem dúvida. Vejo aqui e além uma cruz, ao peito, um crucifixo na parede, pois vivo numa sociedade que se intitula cristã. Como num sobreiro há uma casca grossa a que chamamos cortiça, ao ser tirada deixa o tronco nu, exposto. Assim parece ser o nosso cristianismo. Mera ilustração, sim é verdade, mas leva-me a pensar: que sociedade cristã é a nossa? Quando a maioria das pessoas se diz cristã, mas não sabe porquê ou não vive como tal. Não segue quem a instaurou, não conhece pessoalmente o seu fundador, não se inclina em adoração perante ele, nem sequer o tem como seu SENHOR. É-se cristão por cultura, por nascimento, porque lhe é dito tal desde tenra idade.

No panorama evangélico, ainda que nesta perspetiva, estamos melhor, mas também há que considerar que algo não vai bem e, de forma global, parece que ainda abunda muito o nominalismo e a superficialidade, fruto de uma pregação de um evangelho “light”. Mas talvez o pior ou o mais difícil de lidar seja a falta de compreensão e aceitação da centralidade de Cristo.

Visando este panorama, John Stott numa participação da Eastborn Consultation afirmou que “durante mais de 25 anos dominou a moda do crescimento-da-igreja. E eu me regozijo com as estatísticas, mas digamos que é um crescimento sem profundidade. A nossa preocupação em crescer horizontalmente não foi acompanhada pelo compromisso de crescer em profundidade. Creio que foi Chuck Colson que disse que a igreja cresceu umas 3.000 milhas em extensão, mas somente uma polegada em profundidade” (Ogden, Greg. Transforming Discipleship, p. 22) e, ainda hoje, o maior problema das nossas igrejas é a falta de maturidade de seus membros. No meio evangélico, a que se refere Stott, as aparências e a superficialidade abundam. Há belos templos, mega igrejas, algumas abarrotando de pessoas, outras nem tanto, mas havendo um crescimento global animador, pois têm a estatística de maior crescimento de membros no mundo. Perfeito? Não! Enquanto aqui estamos, teremos de lidar com certas questões nas quais a nossa obediência a Cristo é menor. Uma delas é essa falta de maturidade, pois pouquíssimas são as igrejas que fazem discipulado. Discipulado, creio eu, não é uma opção ou uma escolha que tenha de fazer a ver se faço ou não. Considero-me em desobediência a Jesus por não o praticar.

A supremacia e a centralidade

Ninguém vai ao pai senão por mim.

Há que haver uma entrega incondicional a Jesus para mudar este panorama. Ora, sendo o Novo Testamento, Palavra de Deus, e a linha normativa para a fé cristã, ele aponta constantemente para a supremacia e centralidade de Jesus Cristo.  E tem de ser, porque ele é a expressão corpórea, visível e pessoal de Deus. “Ele é a imagem exata do Deus invisível, mas real, é o primogénito de toda a criação, para ele todas as coisas foram criadas tanto nos céus como na terra, visíveis e invisíveis, sejam tronos, poderes ou potestades”, tudo criado por ele e para ele e nele tudo é sustentado Todo o joelho se dobrará – falar de supremacia é salientar a sua eminência, o posto que alcançou, por direito, ante quem “todo o joelho se dobrará” (Fp 2:9-10) e com um “nome acima de qualquer nome” e isto “porque nele foram criadas todas as coisas nos céus e na terra, as visíveis e as invisíveis, sejam tronos, dominações, sejam principados, sejam poderes, tudo foi criado por ele e para ele” (Cl 2:16). Isto é supremacia.

A Centralidade - A Cruz, revelação do amor de Deus

Ora o Novo Testamento mostra-nos de forma coerente e constante a supremacia e centralidade de Jesus, o que não pode ser repartido por nada nem ninguém. E um desses aspetos é a cruz.

Mas quais são as razões desta supremacia e centralidade de Jesus? De uma forma simples diria que tem a ver com os seguintes aspetos: 1) a cruz faz parte do plano eterno e integral de Deus para salvação do homem e sua morte na cruz foi o modo pelo qual os nossos pecados são completamente expiados e 2) é na morte do Cordeiro de Deus (Apo 13:8), tida desde antes da criação do mundo que se estabelece a nossa reconciliação com Deus. É ali neste ato que Deus nos alcança em perdão, justificando-nos e declarando a justiça que Cristo alcançou por cada um dos salvos.  É central a cruz de Jesus. Toyohiko Kagawa afirma a cruz como “uma oferta de Cristo pelos pecados de outros”, como a “cristalização do amor” e como sendo “o facto singular de Cristo sacrificar-se para redenção dos pecados de outros, é a própria revelação do amor em si” (Stott, John. O Incomparável Cristo, pp.157-8). É singular. É algo único e sui generis numa religião. Já Deus ter procurado o homem e se revelado o que distingue a religião Cristã das demais e, do mesmo modo a cruz também é distinta. Ela não foi um acontecimento acidental, um evento fortuito fruto de tensões ou manipulações políticas ou religiosas num tempo particular, pois poderia ter sido evitada de forma simples. Pelo contrário foi buscada e foi aceite por Jesus, ele sabia a que vinha e que sua morte teria de ser sacrificial, sem culpa e em prol de muitos. Não creio ter sido por tolerância ou conformismo que Jesus foi à cruz, mas por amor e em obediência a Deus pai. 

Mas então sobrevem a pergunta: Cristo morreu em vão? Os seus méritos não são suficientes e capazes. São de eficácia diminuída? Há mérito no que alguém pense fazer por si?

Eduardo Melo