sexta-feira, 31 de agosto de 2018

“O pão nosso de cada dia dá-nos hoje”. Mt 6:11 - Jónatas Lopes

“Pão”:
Esta palavra indica alimento sólido o qual era considerado mais acessível como mais simples. Este pedido a Deus referia-se às nossas necessidades mais básicas: comer, o beber e o vestir. Curiosamente, podemos ver que são as necessidades que Jesus disse, no final deste capítulo, que não nos devemos preocupar.

Porque é que Jesus falou do “pão” e não de outra coisa qualquer? 2 ideias que, pelo contexto, parecem óbvias:

1º. Jesus cuida das nossas necessidades básicas e não das luxuosas.

Devemos viver vidas com sentido, sem preocupação com o dia de amanhã e nem estarmos preocupados em ter luxos.

Creio que, às vezes, por queremos tantas coisas, colocamos a nossa vida familiar em risco. Além disso, esquecemo-nos de celebrar as pequenas coisas que temos.

É raro ver alguém a celebrar o pouco que vai tendo no dia-a-dia. Além disso, se ouvirmos alguém a celebrar esse pouco, talvez achemos que há algo de errado com essa pessoa.

2º. Até nas coisas mais simples, como o pão, precisamos de Deus.

Se repararmos em tantas coisas que precisam de acontecer (cereais, combustíveis, água, etc.) para termos o pão, apenas nos resta agradecer a Deus por isso. Contudo, o ponto não é o “pão” em si.

A principal lição que aprendemos com o “pão” é que Deus cuida realmente das nossas necessidades mais básicas. Então, a preocupação é a evidência de termos um coração que não confia nas promessas de Deus.

É importante saber que o facto de pedirmos o “pão nosso” a Deus, não invalida que trabalhemos para ter o pão até porque acreditamos que o trabalho é uma dádiva de Deus.

“Nosso”
Vemos mais uma vez o plural “nosso” o que nos remete para uma oração comunitária com pedidos igualmente comunitários. Isso nos obriga a deixar de pensar somente em nós para pensar também em nossos irmãos.

Se oramos, é bom dizer que estivemos a orar por ele. Creio que é uma grande bênção poder ouvir alguém a dizer: “eu orei por ti”, mais até do que um “vou orar por ti”.

Agora reparemos: assim como pedir o “pão” impele-nos a trabalhar, também quando pedimos o “pão nosso” implica cuidar dos nossos irmãos na fé que estão a passar por dificuldades. Este é o grande desafio que encontramos em Gálatas 6:10 “(…) Enquanto é tempo, façamos o bem a todos, mas principalmente aos que pertencem à nossa família na fé”.

“Cada dia”
Vemos neste versículo que devemos orar para que o Senhor nos sustente no nosso dia-a-dia com a Sua providência. Qual a razão de Jesus dizer que devemos pedir a Deus que nos dê o “pão nosso” para cada dia e não para o ano todo?

Creio que isso se deve ao facto que se recebêssemos tudo de uma vez, talvez nos esquecêssemos como devemos depender de Deus em todos os momentos.

É curioso notar a oração de Agur em Provérbios 30:8-9 “não me dês nem a pobreza nem a riqueza; dá-me apenas o pão que eu necessito para viver. Para que, porventura, estando na riqueza não te negue, e venha a dizer: Quem é o Senhor? ou que, empobrecendo, não venha a furtar, e tome o nome de Deus em vão”.

É interessante olhar para estas palavras: não me dês nem a riqueza para que não me esqueça de ti e nem a miséria para que não venha a roubar e blasfemar o nome de Deus.

É muito comum ouvir-se dizer: “bastava um pouco mais e ficava melhor”. No entanto, a falta desse “pouco mais”, muitas vezes, é a maneira que Deus usa para dependermos d’Ele.

Creio, também, que Jesus disse para pedirmos para o dia-a-dia para percebermos que a nossa maior dívida foi paga na totalidade por Jesus Cristo. 

Somos desafiados também a pedir para o dia-a-dia porque Deus tem prazer que nos acheguemos a Ele diariamente até porque Ele cuida de nós, também, diariamente.

Precisamos de ter fé para vivermos na dependência de Deus dia após dia. E quando aprendamos a ter esta confiança estamos também a aprender a não ter medo.

A oração lembra-nos que não devemos ter medo de nada até porque Deus é Senhor de ontem, de hoje, do amanhã e para todo o sempre.

Quando o medo chegar até nós, viremo-nos para Deus e digamos: “Pai, eu aceito o Teu cuidado e a Tua provisão neste momento de aflição”. Foi esta a certeza do salmista David quando estava a ser quase apanhado pelos filisteus “Quando tiver medo, confiarei em Ti” – Salmos 56:4

“Dá-nos hoje”
Compreenderemos melhor a bênção da palavra “dá-nos” quando entendemos que tudo o que de bom recebemos é fruto da Graça e onde há Graça não há merecimento – Tiago 1:17 “Tudo o que recebemos de bom e perfeito vem do céu, do Pai”.

Só há “dá-nos” porque Deus na Sua bondade permitiu que pedíssemos. E enquanto estivermos a pedir a Deus, ao mesmo tempo, devemos reconhecer a nossa incapacidade.

Ao orarmos nestes momentos de necessidade, estamos a afirmar a Deus o seguinte: “Que a Tua luz possa brilhar através das minhas necessidades. Que nestes momentos não seja vista a minha preocupação. Seja vista, sim, a confiança na Tua provisão”.

E confiar na provisão de Deus é desejar que Deus seja glorificado no nosso viver quer quando perdermos, ganharmos, ou até quando somos chamados a viver com contentamento com o que temos.

O pão nosso cada dia dá-nos hoje” é, por tudo o que foi dito, uma afirmação de dependência de Deus perante a nossa incapacidade, como também um pedido para sermos bênção para a vida de alguém.

Tenho compreendido que as nossas acções, muitas vezes, são usadas por Deus para responder as orações de alguém. É comum ouvir dizer e até sem sabermos “foste a resposta às minhas orações”.

Que Deus nos ajude!

Jónatas Lopes

O servo enviado, Epafrodito - Rui Ribeiro

Outro excelente exemplo de uma missão de curto-prazo na Bíblia encontramos na visita de Epafrodito a Paulo, em Roma, que nos é dada a conhecer pelo próprio Paulo na carta que escreve aos Filipenses. No capitulo 2 dessa carta, nos versículos 25-30, Paulo justifica porque sentiu necessário devolver Epafrodito aos Filipenses, juntamente com a carta que lhes escrevia.

Nas suas palavras entendemos o amor que os Filipenses tiveram com Paulo que enviaram Epafrodito para o ajudar nas suas prisões em Roma. Entendemos como Paulo ficou sensibilizado com o gesto e que, a certa altura, Epafrodito adoeceu e Paulo chegou a temer pela vida daquele. Epafrodito está claramente com saudades de casa e Paulo quer ter a certeza que ele é bem recebido pelos irmãos quando chegar a Filipos, e faz-lhe incríveis elogios.

Chama-lhe “meu irmão”, mostrando o reconhecimento como verdadeiro irmão na fé; chama-lhe “cooperador”, mostrando o empenho de Epafrodito na colaboração com Paulo no ministério em Roma; chama-lhe “companheiro de combate” como alguém que estivera ao lado de Paulo na guerra espiritual em Roma.

Isto podia ser suficiente, mas Paulo vai ainda mais longe, e chama-o de “mensageiro” e “servo”, usando as palavras “apostolos” e “leitourgos”. Apostolos literalmente significa enviado, mas na linguagem cristã da altura a palavra ganhava todo um enorme peso, por causa dos Apóstolos. Paulo está a conceder-lhe essa prerrogativa pelo amor com que Deus usara a Igreja em Filipos para cuidar dele em Roma, através deste enviado. Leitourgoi eram os homens na antiga Grécia que ofereciam o seu tempo e seus serviços para grandes obras que a cidade precisasse.

Não sabemos quanto tempo Epafrodito passou em Roma com Paulo, mas neste breve relato percebemos que não terá sido muito tempo e que foi um tempo muito difícil para Epafrodito, ao ponto deste ter que voltar para casa bem mais cedo que era suposto.

Entre a doença e voltar para casa mais cedo, podemos pressupor que Epafrodito passou pouco tempo a servir Paulo, mas esse tempo de serviço foi útil. E só o facto de ele ter enfrentado o que enfrentou para trazer a oferta da Igreja em Filipos já tinha sido um grande alívio para o Apóstolo, que passava tempos difíceis no seu ministério. É por isso que Paulo faz todos estes elogios e chega mesmo a dizer nos versículos 29-30: “Recebei-o, pois, no Senhor com todo o gozo, e tende em honra homens tais como ele; porque pela obra de Cristo chegou até às portas da morte, arriscando a sua vida para suprir-me o que faltava do vosso serviço”, colocando Epafrodito como alguém que merece ser imitado nesta sua conduta. 

Rui Ribeiro

A abrangência do relacionamento com os mais novos no plano da Palavra, da cultura e da igreja e suas implicações no ministério pastoral - Teotónio Cavaco

Partindo do princípio observador de que os mais novos se incluem no plano redentor de Deus, fator tão evidente nas declarações da Palavra, nos vestígios encontrados na cultura bíblica e no exercício do ministério dos apóstolos nos primórdios da igreja, tão presente no Livro histórico do Novo Testamento e das Cartas, a pergunta à qual se procura responder é – “que implicações tem isso para o ministério pastoral?”

O manuscrito bíblico dá-nos referências acerca da estratégia do Mestre ao incluir no Seu ministério os mais novos, resultado da Sua compaixão e amor por eles como seres acerca dos quais Ele deseja “que nenhum deles se perca”. Torna-se evidente também o novo lugar que Jesus dá aos mais novos, trazendo-os para o centro das atenções missiológicas, factos bem presentes quando Ele escolhe uma criança que colocou no meio dos apóstolos e a partir dela as caracterizou como “Deles é o reino dos céus”; também quando recebeu das mãos do menino o lanche, a partir do qual Ele alimentou uma imensa multidão e ilustrou o princípio de que Ele é “o Pão da Vida”. O relato bíblico de Actos e também das Cartas não deixam qualquer dúvida quanto ao lugar que os mais novos ocupam no espaço da comunidade espiritual que emerge, creio eu como resultado da visão transmitida pelo Mestre aos seus discípulos e cuja aprendizagem está bem presente quando se constata a presença de gente pequena no exercício de culto e de reunião em narrativas bíblicas como Actos 10, Actos 12, Actos 16, Actos 20 e também em algumas referências feitas nas Cartas que Paulo escreve às igrejas neotestamentárias.

E do ponto de vista social, não sabemos da importância que era dedicada à educação dos mais novos dos tempos de Jesus e no cuidado atribuído à preparação deles para a vida, tão presente no sistema de ensino que se fazia a partir da sinagoga? É verdade que na presença dos doutores da Lei Jesus, enquanto criança surpreendeu-os, mas um judeu da idade de Jesus, que fosse educado conforme o sistema de ensino proporcionado pela escola da época, o sistema da sinagoga, surpreenderia também os “doutores da lei” do nosso tempo. Por alguma razão Lucas 2.52 é a matriz que as igrejas evangélicas deveriam usar para o crescimento efetivo dos seus cordeiros, um crescimento lateral a todas as dimensões da vida.[1] Mas sobre este assunto ainda teremos tempo para falar.

Insisto, perante tamanha evidência do lugar dos mais novos no espaço cultural da igreja emergente, a de Actos dos Apóstolos (esta é a verdadeira igreja emergente), a pergunta que surge na mente é – “será que a igreja de Jesus de hoje ainda carrega o peso de um preconceito que foi abandonado na nova igreja emergente de Actos? Será que os ministérios das igrejas de hoje não deveriam de estar impregnadas de uma cultura de Rebanho onde os mais novos são parte do plano redentor de Deus, vistas não só ao nível da teologia que embeleza as nossas declarações de missão, mas que reproduz no seu sentido prático o papel e a importância do envolvimento dos pastores na dedicação deles aos cordeiros que são parte do Rebanho? É uma pergunta longa, talvez por isso a resposta demore tanto a fazer-se sentir entre nós! 

A título de exemplo, quais são os pastores que pensam na possibilidade de adquirir formação para o trabalho com os mais novos como um benefício complementar da sua preparação pastoral, como um fator enriquecedor na área da evangelização, do discipulado, do aconselhamento pastoral? Por outro lado, quais são as igrejas que estão prontas a apoiar os seus pastores para que eles participem em planos de formação que visam o alcance dos cordeiros e isso se torna tão relevante quanto a preparação que se espera de um pastor que se equipa melhor para a ministração às ovelhas do Rebanho?

Teotónio Cavaco



[1] Intelectualmente (sabedoria), Fisicamente (estatura), Espiritualmente (graça para com Deus) e Socialmente (graça para com os homens).

Shemá é também amar o próximo - Mário Conrado

Ninguém pode amar a Deus de forma isolada dos nossos outros relacionamentos na vida. Por essa razão, Jesus une o mandamento de amar a Deus com o mandamento de amar o próximo como a si mesmo.

Vivemos uma época em que as pessoas centram o seu acto religioso num momento no tempo e no espaço, um culto, procurando assim mostrar o seu amor a Deus, e depois esquecem-se de dar aquele abraço, de ajudar a levantar o caído, de perdoar aquele que o magoou, de ajudar o necessitado. Jesus bem demonstrou que é no amor com que nos amamos uns aos outros que se torna visível que somos discípulos d’Ele. Outro dia, lembrando o texto de João 13, distribui por cada pessoa na igreja uma toalhita dodot, procurando ver qual a reação das pessoas. Todas elas, limparam as suas mãos, mas esqueceram-se da pessoa ao seu lado. Continuamos a viver um cristianismo tão egoísta.

Por isso Jesus assim acrescentou ao Shemá, este versículo de Levítico 19.18, “mas amarás o teu próximo como a ti mesmo. Eu sou o SENHOR”, tornando-o assim parte do mesmo. O Mestre sabia que precisávamos de compreender que o amor a Deus torna-se visível no amar ao próximo.

O texto de Levítico é parte de um texto maior de renovação da aliança. Aqui é exposto os fundamentos do viver, seja a nível espiritual, seja a nível social – deve-se respeitar os pais, cuidar dos pobres, proteger os bens, preocupar-se e ajudar os necessitados ou pobres, buscar a justiça para todos, não usando de vingança, mas tratando a todos, israelitas ou estrangeiros de igual modo. Para os judeus, este mandamento de amar o próximo tornou-se parte deste vínculo com o amar a Deus. De tal forma assim aconteceu que no pensamento do próprio Filo, “amar somente a Deus ou apenas os seres humanos é apresentar apenas meia virtude.”[1] Beale acrescenta ainda que Seder Eliyahu Rabá, “interpreta Deuteronômio 6.5 com discernimento ao afirmar que Israel deve ‘fazer com que [Yahweh] seja amado’ (pela humanidade) por causa da postura de amor do povo para com os outros na vida”.[2]

Desta forma Jesus traz ao de cima a importância do amor ao próximo, numa época em que muitas vezes os judeus procuravam fazer distinção com os gentios, pois estavam debaixo do jugo deles. O amor não pode ser duma maneira para uns e doutra maneira para outros, não importa quem sejam. Se temos o compromisso de amar a Deus, esse compromisso deve ser expresso em toda a nossa conduta e também nos nossos relacionamentos. Aqueles que não demonstram amor pelos outros dificilmente podem alegar amar a Deus. Lembremo-nos de que o próprio Jesus que lembrou este mandamento, demonstrou-o na cruz, ao clamar pelo perdão daqueles que ali estavam. Aliás, tal foi necessário, comprovando o amor de Jesus por toda a humanidade.

Assim o amar a Deus, não é de uma via só. Amamos a Deus pois Ele nos amou primeiro. Assim também devemos viver esse amor uns para com os outros. Jesus colocou o amor por Deus no centro, no coração da lei; o amor pelo próximo deve e vai surgir naturalmente disso como consequência. Mas se tentarmos colocar o amor ao próximo em primeiro lugar ou, pior ainda, deixar de lado o amor a Deus, afundaremos as nossas vidas e deixaremos de amar o nosso próximo como deveríamos. Por outro lado, se dizemos que amamos a Deus e não amamos o nosso próximo, somos hipócritas (1João 4:20).[3]

Assim, como refere Scot McKnight, “amar é a resposta humana ao próximo à luz do amor santo do Abba e no amor santo que sentimos pelo Abba”.[4] 

Por isso devemos amar o próximo, como o próprio escriba, percebeu e compreendeu. Mas como poderemos fazê-lo, sem ser apenas de língua ou conversa? Veremos no próximo e último capítulo… até lá, não se esqueça de amar aqueles que Deus tem colocado à sua volta, ajudando, intercedendo, e porque não também com um sorriso e um abraço!

Mário Conrado




[1] BEALE, G.K. e CARSON, D.A. Comentário do uso do Antigo Testamento no Novo Testamento. São Paulo: Vida Nova, 2014, p. 273.
[2] Ibidem
[3] COLE, R. A. (1994). Mark. In D. A. Carson, R. T. France, J. A. Motyer, & G. J. Wenham (Eds.), New Bible commentary: 21st century edition (4th ed., p. 969). Leicester, England; Downers Grove, IL: Inter-Varsity Press. Em Logos Bible Software.
[4] MCKNIGHT, Scot. O Credo de Jesus. Curitiba: Editora Evangélica Esperança, 2009, p. 62.

terça-feira, 28 de agosto de 2018

Clamor e Lágrimas - Daniel Lopes

“Ele, Jesus, nos dias da sua carne, tendo oferecido, com forte clamor e lágrimas, orações e súplicas a quem o podia livrar da morte e tendo sido ouvido por causa da sua piedade”. Hebreus 5.7

Quando era pequeno houve um cântico que costumava cantar várias vezes. A letra era bem simples e dizia: “Com Cristo no barco tudo vai muito bem, vai muito bem, vai muito bem. Com Cristo no barco tudo vai muito bem e passa o temporal. Passa o temporal, passa o temporal, com Cristo no barco tudo vai muito bem e passa o temporal.” Este cântico era bem bonito… mas bem falacioso também. Quem escreveu esta música esqueceu-se de mencionar que com Cristo no barco surge o temporal, que com Cristo no barco o mar se levanta e o trovão ruge!

Alguns afirmam que viver com Cristo é viver em tranquilidade absoluta. Uma vida sem problemas. Mas, atentando para a história de Jesus narrada na Bíblia facilmente verificamos que não foi desta forma tranquila que Ele viveu. Ele foi perseguido, Ele foi injuriado, Ele foi condenado, Ele sofreu, Ele morreu. Porque será que para nós deveria ser diferente?

Hebreus 5 ensina-nos sobre o sumo sacerdócio do Senhor Jesus Cristo. Este pequeno capítulo da Bíblia contribui, de uma forma especial, para o desenvolvimento desta doutrina cristã. A linguagem usada pelo autor é forte. Champlin considera que ela é “bem forte, mais do que em qualquer outra passagem do Novo Testamento”.[1] Ali podemos ver a humanidade do Senhor Jesus e a real agonia pela qual Ele passou.

Nesta passagem podemos observar que o sacerdote era eleito entre os homens (Hebreus 5.1), que o sacerdote devia estar identificado com os homens (Hebreus 5.2) e que o sacerdote não se autonomeava, mas era nomeado por Deus (Hebreus 5.4). Conforme William Barclay conclui, Jesus Cristo cumpre plenamente as regras do sacerdócio.[2]

No versículo 7, do capítulo 5, o autor de Hebreus mostra que Jesus (curioso que o autor de Hebreus é o único em todo o Novo Testamento que usa o nome de Jesus sem os títulos formais: Cristo Jesus, Jesus Cristo, Senhor Jesus, Senhor Jesus Cristo…) participou na nossa condição humana. Nessa Sua experiência, Ele expressou “forte clamor e lágrimas.”

As palavras que temos traduzidas por forte clamor (κραυγῆς ἰσχυρᾶς - Heb 5:7 BGT) são muito significativas. Elas indicam um grito que é dado sem a pessoa realmente desejar, mas que se escapa da garganta por causa de uma dor insuportável.[3]  A agonia de Jesus era real. A Sua humanidade é visível de uma forma terrível. Ele clamou e chorou!

Wayne Jackson, num artigo sobre as emoções de Jesus, reflete sobre esta passagem e sugere que estas lágrimas foram derramadas por uma humanidade perdida, tão alheia à tragédia prestes a ser executada e conclui que talvez houvesse uma conexão entre as lágrimas de Jesus e aquele grito agonizante da cruz: “Meu Deus, meu Deus, por que me abandonaste?”[4] 

É terrível pensar no preço que Jesus pagou, no sofrimento que experimentou na Sua jornada nesta terra. É tremendo, pela graça, concluir que a Sua encarnação foi por mim, foi por nós e foi por amor! Jesus Cristo compartilhou dos meus temores, dos meus medos e das minhas ansiedades. Ele não fingiu ser um homem, mas foi mesmo. Ele venceu! Mas a sua vitória foi alcançada com clamor e lágrimas.

Compreendo que não há mal em clamar e chorar. O caminho para a vitória nem sempre é tão fácil ou suave como alguns apregoam. Clamar e chorar é natural, é humano. Mas, tal como Jesus, precisamos de aprender e interiorizar a importância de nos voltarmos para o Pai! Ele pode nos livrar do perigo, Ele pode nos livrar da morte, Ele pode nos livrar do mal.  
 
Tal como Jesus, submetamo-nos à vontade de Deus, venha o Seu Reino… ainda que haja clamor e lágrimas! 

Daniel Lopes




[1] CHAMPLIN, Russell N. O Novo Testamento Interpretado Versículo por Versículo, volume 2. São Paulo: A Voz Bíblica Brasileira, s.d., p. 528.
[2] BARCLAY, William. Comentário Al Nuevo Testamento, vol. 13 – Hebreos. Barcelona: CLIE, 1994, p. 59.
[3] Ibidem
[4] JACKSON, Wayne. "The Emotions of Jesus". Disponível em: https://www.christiancourier.com/articles/20-emotions-of-jesus-the