Cresci sendo ensinado
pelo meu avô que o amor é a regra de ouro em qualquer situação. No falar, o amor
torna as palavras doces e encorajadoras; no agir, o amor levanta o braço para
ajudar e abraçar; no silêncio, empresta o ombro e permanece junto. E vi isso
não apenas nas suas palavras, como no seu agir comigo e com outros.
Quando olho para o texto
bíblico em Marcos 12:28-34, percebo que este amor é central na resposta de
Jesus. A pergunta tem a ver com o mais importante de todos os mandamentos. O
que é interessante é que Jesus responde dizendo, “Amarás, pois, o Senhor, teu
Deus, de todo o teu coração, de toda a tua alma, de todo o teu entendimento e
de toda a tua força.” (Mc. 12.30). É interessante que a forma da pergunta feita
pelo Escriba ou Doutor da Lei a Jesus nos evangelhos de Mateus e Lucas, parece
ser feita de forma mais hostil, desejando apanhar Jesus em falso; já em Marcos,
mesmo vindo após ter visto como Jesus respondera bem, parece ser uma pergunta
para discussão, mas procurando enfatizar a resposta, mais do que a pessoa. Aliás,
ele próprio depois elogia concordando com a resposta de Jesus, ao ponto de
considerar que este amor é mais importante que as cerimónias no templo. Beale
acrescenta que “o surpreendente comentário acrescentado pelo escriba deixa
transparecer essa preocupação na referência ao importante tema bíblico de que o
genuíno e sincero amor pelo único Deus verdadeiro (cf. Dt 4.35) e o amor ao
próximo estão muito acima de qualquer quantidade de sacrifícios É possível que
essa ideia esteja subentendida na convicção da comunidade de Qumran de que esse
comportamento faria melhor expiação pelo pecado do que os holocaustos e
sacrifícios, mediante sua perfeita concretização da vontade divina.”[1]
Daí que mais tarde, Paulo diria que qualquer coisa por melhor que seja feita,
sem amor, de nada vale. O amor é que valoriza e dá sabor, seja à verdade, aos
dons, e mesmo à entrega da vida (1Cor. 13). O amor não é mais uma das virtudes,
mas é a virtude que cria o espaço necessário onde todas as virtudes podem assim
brilhar.[2]
Mas porquê então amar a
Deus?
Em primeiro lugar,
devemos amar a Deus, pois Deus é amor. Desde a criação, à nova criação em
Jesus, é visível esse grande amor de Deus. Deus agradou-se do que fez, e apesar
de o homem ter pecado, Ele não acabou com tudo para começar do zero. Porque Ele
amou o auge da sua criação – homem e mulher. E logo traçou um plano redentor,
fazendo uma aliança com ele. Nessa aliança Ele prometeu estar sempre presente.
Ele é connosco. Ele é o Emanuel encarnado. Este princípio da presença divina é
o completar da aliança amorosa de Deus, pois Jesus habitou entre o Seu povo, e
assim será eternamente nos novos céus e nova terra. E essa aliança mostrou a
direção do amor deste Deus – é para com o seu povo, para com aqueles que são
chamados seus filhos. Tornam-se assim o tesouro precioso deste Deus. Como nos
lembra McKnight[3],
Deus libertou Israel das garras do faraó para levá-los à Torah para viverem na
terra prometida, e Deus salva Israel e a igreja a fim de tornar o seu povo,
santo, amoroso e puro. Foi este Seu amor que contribuiu em tudo isto.
Então como amar a um
Deus que é amor?
Jesus respondeu: com
todo o teu coração, a tua alma, o teu entendimento e a tua força. O coração é a
base da vida espiritual e do ser interior, entre outras coisas. Alma refere-se
à própria vida, embora muitas vezes com inferência a sentimentos, emoções e
desejos. Já entendimento, refere-se à compreensão e inteligência e na LXX
frequentemente traduz a palavra hebraica (lebh), ‘coração’. Por fim, força, tem
a ver com a capacidade de uma pessoa, ou seu poder, ou a capacidade de agir.[4]
Jesus queria demonstrar,
que no seu todo, o homem deve amar a Deus, seja emocionalmente, em palavras e
actos. Marcos parece acrescentar ‘entendimento’, em relação à Shemá em
Deuteronómio 6, talvez com o propósito, de num contexto helenista, poder se
entender o que Jesus queria lembrar. É que os gregos faziam uma clara dicotomia
entre coração (emoções) e entendimento (razão), ao contrário dos judeus, em que
todo o ser interior é coração.
Assim se deve amar a
Deus, de forma total e incondicional, pois a essência da vida é o amor, a Deus
e ao próximo. E isto é de tal forma importante, e não para amanhã, mas para
agora, que Rick Warren diz: “A vida sem amor realmente não tem nenhum valor.
(…) A melhor utilidade que se pode dar à vida é amar. A melhor expressão do
amor é o tempo. O melhor momento para amar é agora.”
Esta resposta de Jesus
declara que Deus é o único Deus, e que deve ser amado com todo o nosso ser:
coração, alma, entendimento e força. Mas ninguém pode amar a Deus de forma
isolada dos nossos outros relacionamentos na vida. Por essa razão, Jesus une o
mandamento de amar a Deus com o mandamento de amar o próximo como a si mesmo. E
isto iremos ver no próximo artigo. Até lá lembra-te do amor de Deus…
Mário Conrado
[1] Comentário do uso do Antigo Testamento no
Novo Testamento. São Paulo: Vida Nova, 2014, p. 274.
[2] Scot
McKnight. Kingdom Conspiracy. Grand
Rapids: Brazos Press, 2014, p. 168.
[3] Ibid, p. 169.
[4] Evans,
C. A. (2001). Mark 8:27–16:20 (Vol.
34B, pp. 263–264). Dallas: Word, Incorporated. Em Logos Bible Software.