“Ele, Jesus, nos dias da
sua carne, tendo oferecido, com forte clamor e lágrimas, orações e súplicas a
quem o podia livrar da morte e tendo sido ouvido por causa da sua piedade”. Hebreus
5.7
Quando era pequeno houve
um cântico que costumava cantar várias vezes. A letra era bem simples e dizia:
“Com Cristo no barco tudo vai muito bem, vai muito bem, vai muito bem. Com
Cristo no barco tudo vai muito bem e passa o temporal. Passa o temporal, passa
o temporal, com Cristo no barco tudo vai muito bem e passa o temporal.” Este
cântico era bem bonito… mas bem falacioso também. Quem escreveu esta música
esqueceu-se de mencionar que com Cristo no barco surge o temporal, que com
Cristo no barco o mar se levanta e o trovão ruge!
Alguns afirmam que viver
com Cristo é viver em tranquilidade absoluta. Uma vida sem problemas. Mas,
atentando para a história de Jesus narrada na Bíblia facilmente verificamos que
não foi desta forma tranquila que Ele viveu. Ele foi perseguido, Ele foi
injuriado, Ele foi condenado, Ele sofreu, Ele morreu. Porque será que para nós
deveria ser diferente?
Hebreus 5 ensina-nos
sobre o sumo sacerdócio do Senhor Jesus Cristo. Este pequeno capítulo da Bíblia
contribui, de uma forma especial, para o desenvolvimento desta doutrina cristã.
A linguagem usada pelo autor é forte. Champlin considera que ela é “bem forte,
mais do que em qualquer outra passagem do Novo Testamento”.[1] Ali podemos ver a humanidade do Senhor Jesus
e a real agonia pela qual Ele passou.
Nesta passagem podemos
observar que o sacerdote era eleito entre os homens (Hebreus 5.1), que o
sacerdote devia estar identificado com os homens (Hebreus 5.2) e que o
sacerdote não se autonomeava, mas era nomeado por Deus (Hebreus 5.4). Conforme
William Barclay conclui, Jesus Cristo cumpre plenamente as regras do
sacerdócio.[2]
No versículo 7, do
capítulo 5, o autor de Hebreus mostra que Jesus (curioso que o autor de Hebreus
é o único em todo o Novo Testamento que usa o nome de Jesus sem os títulos
formais: Cristo Jesus, Jesus Cristo, Senhor Jesus, Senhor Jesus Cristo…)
participou na nossa condição humana. Nessa Sua experiência, Ele expressou
“forte clamor e lágrimas.”
As palavras que temos
traduzidas por forte clamor (κραυγῆς ἰσχυρᾶς - Heb 5:7 BGT) são muito
significativas. Elas indicam um grito que é dado sem a pessoa realmente
desejar, mas que se escapa da garganta por causa de uma dor insuportável.[3] A agonia de Jesus era real. A Sua humanidade
é visível de uma forma terrível. Ele clamou e chorou!
Wayne Jackson, num
artigo sobre as emoções de Jesus, reflete sobre esta passagem e sugere que
estas lágrimas foram derramadas por uma humanidade perdida, tão alheia à
tragédia prestes a ser executada e conclui que talvez houvesse uma conexão entre
as lágrimas de Jesus e aquele grito agonizante da cruz: “Meu Deus, meu Deus,
por que me abandonaste?”[4]
É terrível pensar no
preço que Jesus pagou, no sofrimento que experimentou na Sua jornada nesta
terra. É tremendo, pela graça, concluir que a Sua encarnação foi por mim, foi
por nós e foi por amor! Jesus Cristo compartilhou dos meus temores, dos meus
medos e das minhas ansiedades. Ele não fingiu ser um homem, mas foi mesmo. Ele
venceu! Mas a sua vitória foi alcançada com clamor e lágrimas.
Compreendo que não há mal em clamar e chorar.
O caminho para a vitória nem sempre é tão fácil ou suave como alguns apregoam.
Clamar e chorar é natural, é humano. Mas, tal como Jesus, precisamos de
aprender e interiorizar a importância de nos voltarmos para o Pai! Ele pode nos
livrar do perigo, Ele pode nos livrar da morte, Ele pode nos livrar do
mal.
Tal como Jesus,
submetamo-nos à vontade de Deus, venha o Seu Reino… ainda que haja clamor e
lágrimas!
Daniel Lopes
[1] CHAMPLIN, Russell N. O Novo Testamento Interpretado
Versículo por Versículo, volume 2. São Paulo: A Voz Bíblica Brasileira, s.d., p.
528.
[2] BARCLAY, William. Comentário Al Nuevo Testamento,
vol. 13 – Hebreos. Barcelona: CLIE, 1994, p. 59.
[4] JACKSON, Wayne.
"The Emotions of Jesus". Disponível em:
https://www.christiancourier.com/articles/20-emotions-of-jesus-the