terça-feira, 28 de agosto de 2018

Ensino e Revelação - António Bento

Quatro cenários distintos, quatro mesas repartidas, quatro condutas erradas, uma mesma resposta por parte de Jesus. À mesa, Jesus confrontou-se com ansiedade, hipocrisia, desânimo e incredulidade, mas respondeu sempre do mesmo modo. 

Com Maria e Marta (Lc 10.38-42), Jesus presenciou um mal que muito nos afeta. Marta andava distraída, de tal modo assoberbada em tarefas, que nem tinha tempo para o Senhor. O contraste lancinante com a sua irmã que, embevecida com o Senhor, se instalou aos seus pés, foi o estímulo para que Marta deixasse escapar toda a sua ansiedade. A resposta de Jesus não se fez esperar: “Marta, Marta”. E ensinou-lhe algo crucial para todos nós, que nada há mais importante do que ouvirmos Jesus e a sua Palavra, nela meditarmos, deixando-nos penetrar e inspirar pela sua plena verdade. Que ninguém nos tire essa que é a “boa parte”! Uma só coisa nos basta, aquilo que é eterno, diz-nos Jesus. Mas Marta escolhia o incidental e não o importante, o temporal em lugar do eterno. O Mestre ensina, então, que a festa espiritual se sobrepuja à festa material.

Com um fariseu (Lc 11.37-54), Jesus se confrontou com a hipocrisia das regras esconsas, que se sobrepunham ao mais importante, ao único e verdadeiro propósito da Lei, o amor. As manchas exteriores dos pobres gentios pecadores, nada eram quando pesadas à luz do pérfido negrume interior, que grassava entre os falsos fariseus. Estes, vaidosamente, arrogavam ser perfeitos em contraste com um mundo de gentios, de cuja podridão se queriam isolar com as muitas lavagens. A resposta de Jesus não se fez aguardar e com muitos “ais”, o Senhor ensina, pela Palavra, a iniquidade de que está revestido um zelo falso pelas coisas exteriores e pelos detalhes, em detrimento da justiça e do amor de Deus, que Ele veio manifestar ao mundo.

Com dois discípulos desanimados (Lc 24.13-35), a caminho de Emaús, incrédulos com a recente morte do seu Mestre e sem fé na sua apregoada ressurreição, Jesus, literalmente, se viu forçado, qual “saca rolhas”, a abrir-lhes os olhos à mesa quando, sujeitos ao calor da Palavra, ainda assim não compreendiam quem era este que os acercava e exortava. A resposta de Jesus é, amorosamente, contrariar a sua visão turva de umas escrituras que viam parcelarmente, apenas naquilo que convinha ao seu orgulho nacional, firmado numa crença de um Messias que viria somente para os servir, trazendo livramento do jugo romano. Ao invés, apontou-lhes para a Palavra, revelando que o sofrimento ocorrido era um prelúdio necessário para a entrada do Messias no Reino da sua glória. E o véu caiu, revelando-se-lhes Jesus em todo o seu esplendor e glória, criando-lhes a fé, ativando-lhes o amor, e vivificando-lhes a esperança.

Com os seus discípulos mais próximos (Lc 24.36-48), Jesus deparou-se com um dos piores males, a incredulidade. Mediante a sua visita inesperada, responderam com espanto e temor, pensando estar a vislumbrar algum fantasma. A perturbação sobrepunha-se à fé e a incredulidade vencia a passos largos nos seus corações. A resposta de Jesus é quase mundana: “Tendes aqui alguma coisa que comer?”, porque os espíritos, certamente, não comem peixe e mel e o que viam agora diante dos seus olhos e tocavam com as suas mãos não era um espírito desencarnado de um homem morto, mas o corpo ressurreto do Filho de Deus encarnado. E por esta via, Jesus lhes abriu o entendimento para as Escrituras, para um Cristo que havia de padecer, mas ressuscitar, para remissão dos pecados, em todas as nações, a partir de Jerusalém.

Ansiedade, hipocrisia, desânimo e incredulidade, quatro posturas erradas tão comuns nos nossos dias, mas um único “instrumento” de resposta, uma única “arma”, o ensino da Palavra, que revela quem é, de facto, Jesus. À mesa, Jesus mostra-nos que Ele só é reconhecido através da sua Palavra, que apenas esta pode corrigir os corações desviados e que somente a sua exposição inflama corações e mostra o caminho para o Salvador. À mesa, somos convocados por Jesus para abrirmos a Palavra com os perdidos, para que os seus olhos se possam descerrar de par em par e possam contemplar o Rei da Glória, que os quer convidar para a sua mesa eterna.

António Bento