Cinco refeições, duas
curas e muita provisão, assim Jesus nos conduz com um guião natural, mas que se
move sempre à volta do sobrenatural. Leva-nos primeiro para uma boda (Jo
2.1-12), onde se acaba a bebida principal. Aflita, a mãe de Jesus, o intimou.
Ele, imbuído de generosidade, ordena que venha a água da purificação e a
transforma num vinho passível do melhor prémio. A sua presença compassiva
transfigurou a cena, transformando o que antes era inadequado em algo
suficiente para prover mesmo as necessidades dos mais exigentes. Liberdade e
alegria ocupavam agora o lugar do que antes era consternação.
Em duas mesas
improvisadas Jesus alimenta duas multidões esfomeadas com um cardápio que nada
de especial aparentava, pães e peixes, mas na verdade algo de tremendo estava
por trás de tão humilde refeição. Na primeira vez, Jesus embora retirado num
deserto perto de Betsaida (Lc 9.7-22), entre judeus, não conseguiu deixar de
receber a multidão que sofregamente o buscava, e tomado de compaixão,
falava-lhes do Seu Reino e a todos curava sem discriminação. Mas quando chegou
a hora em que a fome apertou, a humanidade desceu sobre o coração dos seus
discípulos, que queriam que despedisse a multidão, para que procurassem a sua
própria provisão. Mas Jesus, movido de compaixão, ao invés, decide alimentar a
multidão. Enfatizando a inaptidão dos discípulos para providenciar fosse o que
fosse, revelou que Ele mesmo é o Deus de toda a provisão, multiplicando pães e
peixes, fornecendo o primeiro maná provindo do céu desde a longínqua travessia
do deserto, e antecipando o banquete messiânico prometido. E assim se revelou
sobrenaturalmente como o Deus de toda a compaixão e provisão. Mas drama dos
dramas, nem os seus discípulos o parecem ter entendido.
Pouco depois, noutra
mesa inventada, num monte com vista para o mar da Galileia (Mt 15.29-39), desta
vez principalmente entre gentios, o argumento parece repetir-se, como se de um replay se tratasse. Incrédulos os
discípulos voltaram a perguntar onde iriam arranjar alimentos para tão grande
multidão e, compassivamente, uma outra vez Jesus multiplica o que era pouco,
para que os muitos fossem amorosamente saciados. Esta repetição não é, contudo,
inócua. Se a alimentação dos cinco mil, em território judaico, era um vislumbre
do banquete messiânico, o banquete dos quatro mil, em território gentílico,
garantia que os gentios também partilhariam da bênção suprema prometida ao povo
de Israel.
À mesa de um importante
fariseu (Lc 14.1-14), perante o escrutínio rigoroso da “casta perfeita”, Jesus
não se deixou intimidar e, impelido por profunda compaixão, atropelou as leis
do sábado para atender as aflições de um hidrópico. Cura era o que ele
precisava e cura foi o que ele recebeu. Às regras farisaicas, vazias de amor,
Jesus sobrenaturalmente respondeu, mostrando que para Deus o homem vale mais do
que o sábado. E num golpe de génio, aproveita a ocasião para admoestar
rigorosamente os convidados a que quando convidassem pessoas para jantar em
casa, não convidassem os amigos, ou irmãos, ou parentes, ou os vizinhos ricos,
para que não fosse ocorrer que recebem a recompensa da retribuição, mas ao
invés, que convidassem os pobres, cegos e aleijados, que não poderiam jamais
retribuir. A recompensa, essa viria na ressurreição. E mostra, pois, que a sua
mesa está fundamentada numa ética de graça, em contraposição com uma lógica de
reciprocidade.
Na última mesa, em casa
de simão o “Leproso”, algo de surpreendente acontece, aquele que era o Senhor
de toda a compaixão e generosidade é aqui o alvo da compaixão e generosidade de
uma humilde mulher (Mt 26.6-13). Esta irrompe pela casa e, sem qualquer
convite, derrama sobre a cabeça de Jesus um perfume de muito valor, pressagiando
a sua morte como Messias prometido. As críticas, dos próprios discípulos,
vieram em coro, lamentando o tremendo desperdício, obrigando Jesus a salientar
o valor inestimável daquele ato de profunda caridade e a aproveitar para lhes
expor que sempre devem ter como foco a assistência amorosa e compassiva para
com todos os necessitados.
À mesa, Jesus nos mostra
que, tal como Ele, devemos ter compaixão e generosidade para com os perdidos
que nos rodeiam. Ele nos instiga a convidá-los para a mesa, onde Ele pode
trazer cura e provisão para as suas vidas exauridas. Ele é o Messias da mesa
aberta, que nos convida a ser a sua extensão no mundo, amando de forma prática
os descrentes à nossa volta, materializando fisicamente a alegria messiânica
que quer encher a suas existências do gozo e paz de Deus.
António Bento
António Bento